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notas da realidade ficcionada na lezíria
Restam três cigarros no maço. Um maço por dia, nunca é bem um dia de manhã à noite. Um maço, 24 horas. Três cigarros e ainda faltam tantas horas. O melhor é comprar o maço para o dia que aí vem. O tempo em cigarros como uma ampulheta de tabaco. Falta ainda o longo fim do dia. O melhor é comprar mais coisas. Faço a lista: pão, manteiga, ovos, detergente, papel higiénico, comida para o gato, talvez um gelado. Não compro água. Eu e o gato bebemos água da torneira. Nunca nos aconteceu nada. O tempo vai passando em tabaco. Faltam agora dois cigarros e está calor. Faltam ainda os outros vinte e assim sucessivamente. Vinte unidades de tédio. Os dias a esfumarem-se para nada.
Senhor F: Falta muito?
Senhor Gras: Dá-me impressão que não.
Senhor F: A que distância estamos?
Senhor Gras: Não tenho ideia, mas devemos estar perto.
Senhor F: Quanto tempo passou desde que saímos?
Senhor Gras: Um bom bocado.
(O Sr. F começa a ficar impaciente)
Senhor F: Que horas são?
Senhor Gras: Devem ser aí umas quatro e meia.
Senhor F: Vê no relógio.
Senhor Gras: Não trouxe.
Senhor F: Então como é que sabes?
Senhor Gras: Devem ser... O sol está ali, são para aí quatro ou quatro e meia.
Senhor F: Há alguma coisa que possas garantir que não sejam só palpites?
Senhor Gras: Há um ditado qualquer que diz que a experiência é a mãe de não sei quê. Pronto, é isso.
Senhor F: Estamos perdidos...
Senhor Gras: Estamos sempre.