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notas da realidade ficcionada na lezíria
O inverno, este ano, está a aparecer aos bocados, como num puzzle. Hoje, chegou a chuva, à hora do almoço. Quando cheguei ao gabinete ainda não estava cá ninguém. Por isso, fiquei a observar a rua da janela: os carros com os faróis ligados, iluminando a chuva oblíqua, atravessando lentamente a rua, quase a medo; as pessoas a fugir como que de uma catástrofe; tudo o resto - as árvores, o passeio, os carros estacionados, as cadeiras e as mesas da esplanada do Aracuá - imóvel e indiferente.
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Creio que a melancolia da chuva está relacionada com a reconstrução da imagem em movimento. Quando observamos a rua, sem a informação do som, usamos a imaginação para preencher o que está em falta e, então, transformamos a ideia da imagem em algo íntimo, como se fosse uma criação nossa. E, manipulada, a ideia torna-se confortável mas, ainda assim, apenas uma memória. Com o som, sem a imagem em movimento, a mesma coisa. É a memória dos sentidos, mesmo que seja por nós ficcionada ou sugerida por outro elemento externo: a literatura, o cinema, a música.