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notas da realidade ficcionada na lezíria
Saímos a correr do metro em direcção a uma pequena coffee-shop numa das primeiras ruas do bairro. Não era bem um café, daí que lhe chame coffee-shop, visto que lhe dá o tom pretensioso e deslumbrado necessário. Era um lugar confortável onde nos separávamos temporariamente do desalento da chuva e do vento. Do lado direito, uma mesa com duas poltronas onde dois tipos bem parecidos se encontravam sentados. Um deles lia uma revista, o outro parecia atarefado com as definições do telemóvel e ia trocando impressões com o dono do negócio, numa voz muito bem colocada que enchia a sala de uma certa familiaridade, apesar do excessivo tom cosmopolita, de quem está no seu domínio e o resto é senão paisagem. Talvez estivéssemos ali a interromper aquele momento de alguma privacidade com silêncio, ou pelo menos ficou essa sensação, quando a música assumiu o protagonismo do espaço. O tema que soava nas colunas não era difícil de reconhecer, naquele ano de 2006, pelo sucesso que garantiu ao ambiente destes lugares da urbanidade, criando dentro do ruído e da urgência da cidade um breve espaço de languidez e doce melancolia. Nos anos seguintes, o som chill-out desse Love can damage your health, dos Télépopmusik, perder-se-ia no meio de outras novidades. Daquele fim de tarde de chuva, no chamado coração de Lisboa, sobrou a urgência e perdeu-se a estética - o único sítio onde gostamos de regressar.